13 de janeiro de 2008

A propósito do acto de treinar escalões de formação

Nas minhas leituras sobre treino desportivo, o treino de jovens é sempre um tema recorrente, e pelo qual nutro uma atenção particular. Aliás, tenho para mim, no meu inconsciente, que livro técnico no qual não haja referência ao treino de jovens não é um livro completo. Muitas das vezes, se tiver um capítulo sobre os mais jovens, já é um ponto a favor da sua aquisição e por conseguinte da sua leitura.

Vem isto a propósito de um livro que se intitula “Se não fosse para ganhar…” o qual ao primeiro olhar pensei, “ mais um dos muitos que este ano são sobre a temática em voga” que bem sabemos qual…Futebol. Mesmo assim decidi-me por ver melhor o dito manual, e eis que a letras mais pequenas aparece “a importância da dimensão táctica no ensino dos Jogos Desportivos Colectivos”.
Após a leitura do verbo “ensino” decido folheá-lo e vou directo ao Índice.
Apercebo-me, pela estrutura apresentada, que o manual merece a leitura e que não é sobre futebol.

E não é que não me arrependi nem um pouco pela decisão tomada.

Veja-se o que o autor, António Pinto Lopes, na página 80, escreve a propósito da realidade do treino de jovens:

O que estamos afinal a oferecer aos jovens?

.Sessões de treino monótonas – ainda predominam, na maioria dos casos, o ensino das técnicas fora do contexto do jogo;

. Competições onde o stress é na maior parte das vezes excessivo para a idade dos praticantes – o “ganhar” nos escalões de formação constitui uma obsessão por parte dos treinadores, e mais recentemente, também por parte dos encarregados de educação;

. A necessidade de apresentar resultados leva muitas vezes a uma dedicação excessiva à actividade e ao afastamento dos colegas;

. O volume do treino, em muitos casos excessivo em função do escalão etário dos praticantes;

. A obsessão por rendimentos precoces – o ditado “de pequenino é que se torce o pepino” tem sido responsável por muitos excessos cometidos, no treino de crianças e jovens.

Mais à frente, página 83, o autor indica uma série de preocupações que têm de constar no âmbito do processo de formação de jovens atletas.
E diz:

Em termos operacionais exige-se uma prestação de serviços de qualidade no ensino dos JDC no respeito, entre outros, pelo seguinte decálogo:

1- Necessidade de sucesso individual, em especial, numa primeira fase da aprendizagem;

2- Propostas metodológicas capazes de suscitar a adesão das crianças e dos jovens, porque adaptadas ao escalão etário considerado, logo alegres e que proporcionem prazer pela sua dinâmica, embora sem perda de eficácia;

3- Enquadramento humano qualificado e especializado, atento às tendências mais recentes ao nível da investigação;

4- Condições de envolvimento ao nível dos recursos humanos (dirigentes, pais e treinadores) pouco agressivas;

5- Condições estimulantes ao nível do apetrechamento;

6- Quadros competitivos adequados, ao escalão etário considerado, sem procurar tirar conclusões “definitivas” e apressadas;

7- Encarregados de educação participativos e informados que exijam um enquadramento de qualidade para os seus educandos, mas que ao mesmo tempo concedam espaço e liberdade indispensável a quem ensina;

8- Selecção de atletas para o sucesso (rendimento), realizada com apoio cientifico de entidades competentes (Escolas de Ensino Superior) e devidamente integrada no Sistema Desportivo;

9- Garantias da continuidade da prática desportiva, para aqueles que não têm condições para enveredarem pelo rendimento (a esmagadora maioria, cerca de 80%);

10- Respeito pelo jovem atleta, afinal a razão de ser da actividade desportiva.


Fonte:
António Pinto Lopes: “Se não fosse para ganhar…a importância da dimensão táctica no ensino dos Jogos Desportivos Colectivos”. 2007. Campo das Letras

2 comentários:

Anónimo disse...

Olá. Parabéns pelo blog.
Sobre a temática deste post, recomendava a leitura do livro "Nenhuma medalha vale a saúde de uma criança" de Jacques Personne, da Livros Horizonte.
É bastante mais antigo, mas o assunto está tratado com todo o pormenor e rigor científico. Vale a pena.
Ricardo Teixeira

Francisco Mendes disse...

Bom dia Ricardo Teixeira,
Antes de tudo, muito obrigado pelo seu comentário, é sempre bom receber feedback e nem sempre as pessoas param e escrevem. Quanto ao livro que fala eu conheço-o, contudo já o li há alguns anos, mas brevemente irei pegar nele novamente.Obrigado pela sugestão.
Francisco Mendes